terça-feira, 8 de julho de 2008

ALUNO: INDIVÍDUO RESIGNIFICADO

Norma de Souza Lopes
nosolo@ig.com.br

Na luta cotidiana de educar nos deparamos com um aluno diferente daquele que desejamos encontrar. O sujeito que esperamos de nosso aluno não é nosso aluno, é uma representação pessoal que cada um de nós traz dentro de si acerca do aluno ideal. E quando idealizamos, negamos sua identidade e isso solapa todas a suas possibilidade de êxito. Fica impossível para ele superar o caos instalado pela negação existencial.
Se o educador idealiza o aluno, nega-o como sujeito-aluno, como ser sapiente. Retira dele a validade de seu saber. Ele então tenderá a negar o papel e autoridade do professor devolvendo a invalidação. Aquele que costuma ver negada diariamente sua existência em seu ambiente familiar passa a viver uma negação da mesma magnitude no ambiente escolar. Porém desprendida dos poderes patriarcais, tende a sublevar agressividade, inaudição e revolta, uma vez que os limites não são tão rígidos como em casa.
Podemos observar então que o resultado, invariavelmente, é a indisciplina. A conversa excessiva e a indisciplina nos dizem sempre: “Se você não me reconhece como aluno eu não te reconheço como professor”. “O que você tem a dizer não me interessa porque me é inalcançável.” “Não me interessa por que não significa nada no meu mundo real”.
Para esse aluno a indisciplina é benéfica porque alivia a angústia de não compreender o discurso escolar, angústia de não se parecer com o aluno idealizado. Infelizmente para ele a escola não é um lugar de vida, é apenas um lugar de ensino (do latim insignare: ato de lançar dentro de uma sina, de uma sorte alheia a sua vontade). A brincadeira, as conversas paralelas e as piadas são uma tentativa de transformar a escola num lugar onde ele pode se furtar do mundo que detesta: o mundo institucionalizado (família, igreja, sistema legal etc.).
Ele procura um rompimento com esse mundo, tenta relacionamentos de sucesso entre seus pares, tenta ser o herói ou anti-herói querido. Recusa-se a ser escolarizado para não permanecer prisioneiro de uma sistema de ensino em que não se aprende nada de útil para a vida.
O que o professor, como adulto centrado, deve fazer é validar o aluno real que encontra na escola. Não há nada mais educativo que legitimar o aluno e o que ele sabe. O professor deve reconhece-lo e acolhe-lo se dispondo a estabelecer com ele um relacionamento confiável.
A relação mestre-discípulo instaurada quando o professor se dispõe a relacionar não tem preço. O que se encontra compartilhando vai além da disciplina intelectual ou na escola: é a amizade que o jovem , por vezes, descobre pela primeira vez em sua vida. O mestre-amigo legitima a existência de seu aluno, aceita-o como sujeito sapiente. O professor que se abre para esse modelo de relacionamento não costuma ter problema com indisciplina.
Não se deve esquecer no entanto que os efeitos desse relacionamento só são benéficos, na medida em que o professor conhece o seu papel e tem uma vida pessoal bem sucedida. Um professor confuso, com pouca inteligência emocional pode provocar estragos irreparáveis ao se aproximar demais de seus alunos. Vale aqui, como em todo lugar, a medida do equilíbrio.
Para realizar aproximações eficientes o professor deve ter claro a importância dessas aproximações, compreendendo sua limitações e possibilidades. Mas acima de tudo ele deve desejar fugir do modelo ilusório de aluno que o faz perceber o OUTRO de maneira deformada, ou seja, arranca do aluno aquilo que o torna particular e diferente. Arranca dele sua competência de INDIVÍDUO.
Quem reputa-se educador deve caminhar no sentido de ressignificar suas representações acerca do que o aluno é. Deve imergir prazerosamente nas diferenças reais de seus alunos, fugindo de toda ilusão. Ilusão só traz sofrimento.

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