quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Invídia


Atendia pelo nome de Virgílio.
Desde moço seu pai o estimulara a competir e a destruir seus adversários. Era existir e sobreviver. Tinha que ser sempre o vencedor. Se não vencesse sentia-se menor do que os outros. O pai o fazia sentir-se assim.
Era comum vê-lo desgostoso quando alguém alcançava grande sucesso ou felicidade. Achava que o vitorioso havia invadido o seu território. Desejava se apropriar da alegria do outro, arrancá-la dele. Era tomado por um sentimento de raiva e de ira por que sentia-se merecedor das conquistas alheias.
No começo ele não identificava a inveja. Era sempre aquela sensação indiscriminada de dor e humilhação por que o seio da mãe era pleno de leite, por que o irmão mais novo estava recebendo mais amor, por que o vizinho tinha um brinquedo que ele queria... 
Depois percebeu que esse era um sentimento malévolo e pouco aceito por todos. Estão passou a dissimulá-lo e mascará-lo em suas ações.  Escondia sua natureza invejosa. O esforço que despedia para esconder tal mazela da alma era tanto que vivia doente e estressado. 
Simulava ter uma individualidade. Fingia ser alguém centrado  e resolvido. Mas não era autêntico. Era inapto para ver sua própria incapacidade e inércia. Os outros a sua volta também. Às vezes era cercado por um séquito de admiradores que, por  medo de retaliações ou simples associação maldosa, apoiavam o massacre ou o escárnio exercido por Virgílio.
Se vangloriava, enaltecia-se, falava excessivamente bem das próprias coisas, pois assim abrandava o mal-estar do desequilíbrio, procurando diminuir o outro através de crítica. Não percebia, muitas vezes, as suas frustrações. Era como se elas não existissem.
Achava difícil suportar que o outro tivesse alguma coisa boa. Era comum encontrar sempre uma razão para duvidar daqueles que estavam à sua volta com o objetivo de derrubá-los. O exercício, comum a todos, de seguir modelos vitoriosos não funcionava com ele. Não conseguia encontrar o que elogiar, ou valorizar nos outros. 
E pior, podia ser voraz e antropofágico quando queria que suas idéias vencessem ou quando invejava a inteligência e a tranquilidade de outros. Punha-se a criticá-la até que elas perdessem a calma. Sempre atingia seu alvo.
Estava sempre provocando e escarnecendo. Quando a patologia chegava aos extremos, chegava a praguejar, desejando ao invejado as piores desgraças. Passava o tempo boicotando, fofocando e  preparando armadilhas, a fim de destruir os outros, para provar para si mesmo que era melhor. 
Mas toda essa violência não passava impune. Em pouco tempo ficava cercado de inimigos. O grupo de seguidores, não suportando ser também vitimas da inveja de Virgílio, acabavam arrefecendo e o abandonando. 
Então ele começava a se isolar. Em casa ficava fechado no quarto e no trabalho abraçava tarefas árduas, que tomassem todo o seu tempo. Começava a construir formas de trocar os espaços de convivência até conseguir.
E quando finalmente conseguia um habitat diferente, começava tudo de novo.


Norma de Souza Lopes


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