quinta-feira, 26 de julho de 2012

Presa nos braços da experiência

Uma palavra me prendeu em seus braços. Meu contexto está mergulhado nela. Experiência. Evoca o risco que eu me propus a correr quando saí da zona de conforto de trabalhar perto de casa, fazer o trabalho que conheço bem todos os dias, meses e anos. Quem me conhece sabe do que estou falando. Fazer algo distante daquilo que já tenho experiência é trabalhoso mas foi isso que fiz quando me bandeei pros lados da poeisa e principalmente dessa oficina de performace da qual tenho tanto falado aqui. Remete também a esse esforço quase compulsivo ao qual tenho me atirado desde que comecei a escrever poesia. Não há um dia sequer, desde os idos de 2007, quando decidi assumi integralmente as consequência de viver, que deixo de escrever. Trata-se de um impulso irresistível de testar em palavras o que penso e sinto. E a palavra se presta maravilhosamente a isso. 
Satisfatório mas um tanto perigoso. 
Apesar de meu mundo do trabalho ser aprender/ensinar também é, maciçamente, um desagradável esforço físico e mental, institucionalização e burocracia. Me engole como uma sombra negra e quase não me deixa respirar.
O risco que corro nesse momento é o de mergulhar inteiramente nessa nova dimensão da poesia -corpo-voz-palavra- e não ser capaz de transitar nos dois mundos porque o segundo, mais agradável, mostra-se como um mundo de pura fruição. 
O tempo todo venho tentado aproximar os dois, sabendo que ainda não poderei fugir à luta.
Não muito longe de minha elocubrações leio no grande Houaiss que a palavra experiência deriva do latim periri. Dele só restou o particípio passado peritus, que passou diretamente para o português com perito, habilidoso, experimentado. Daí também com a preposição “ex” surge no latim experientia, que significa prova, ensaio, tentativa, experiência, e no latim imperial, experiência adquirida. 
Assim o termo experiência pode significar tanto uma tentativa, uma prova, num sentido mais objetivo de algo que se faz, como o que resta de aprendido a partir de várias provas no decorrer da própria vida, num sentido agora mais subjetivo. Ou seja experimentando uma pessoa pode passar a ser experiente.
Derivaram daí: experimentum (prova pelos fatos, comprovação) e o adjetivo expertus (experimentado, que deu provas de conhecimento – donde no inglês expert, especialista, e no português experto no sentido de versado, conhecedor; mas não confundir com esperto que tem outra origem). 
De periri (tentar, provar, empreender, experimentar), de onde saiu experientia (o que decorre da tentativa, do empreendimento), derivaram também periculum (tentativa, prova, risco, exame), o adjetivo periculosum (arriscado, perigoso), o verbo periclitor (fazer uma tentativa, arriscar, pôr em perigo), peritus (que sabe por experiência, perito, instruído), imperitia (imperícia, ignorância). Daí derivaram em português: experiência, perigo, perigoso, periclitante, perito, perícia. Ainda segundo Houaiss e Villar (2001) todas essas palavras se relacionam com o grego peíra (prova, tentativa), o verbo peiráo (tentar, empreender), peiratés (aquele que tenta um golpe, bandido, pirata), empeiría (experiência, e, como importação direta feita pela filosofia, “empiria”, conjunto de dados conhecidos não pelo raciocínio lógico, mas pela experiência sensorial) e empeirikós (que se dirige segundo a experiência)
Na etimologia da palavra vejo descortinar-se também todo o meu conflito. Experimentar está muito proximo de correr riscos, de flertar com o perigo. 
Ando flutuando continuamente entre o impulso de imergir profundamente e de manter a cabeça fora d' água. 
Recessos , férias e feriados fazem isso comigo. Perco um pouco a vontade de permanecer a serviço dessa roda dentada que é uma instituição. Mas há que alimentar os filhos, antes de alimentar a alma.
Volto a trabalha na quarta-feira com esperanças de que a sombra do trabalho não me engula e que eu possa, como tenho feito nos anos anteriores, ser capaz de pequenos mergulhos nesse mar de poesia mesmo sob a sombra do labor.

Norma de Souza Lopes

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