quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Dancemos

Descobri minha potencia na quinta série. Dançava ao som de "Menina Veneno" do Ritchie no pátio da escola durante o recreio. Rolava uma treta de autógrafo, uma fila de admiradores armada pela oitava série. Eu me sentia o próprio Sol. Dancei até a sétima serie quando,  a partir de um insight devastador, percebi que aquela fila, que ocasionalmente me abordava,  significava a forma mais cruel de humilhação- a pseudoindulgência com alguém que é considerado tolo. Desde estão enterrei minha potência enquanto dança,  continuar com aquilo me parecia patético. Fui fazer outras coisas. Ser professora, poeta, escritora. E como toda pessoa que enterra por fraqueza sua vontade, tornei-me um ser esquizofrênico que transita entre a gueixa gauche e um tsunami. Hora agrado, hora soterro quem está a minha volta. Trata-se de uma existência muito triste. Gueixa porque coloco tudo que em mim é arte a serviço do outro. Tsunami por que, as pequenas rachaduras que se formam no mar do meu inconsciente, no contato com o outro abusivo, somado a uma paciência elástica, quando tensionada ao máximo, explode e fere todo mundo. 
Gostaria muito de trazer comigo apenas a delicadeza das gueixas. Invejo a capacidade das gueixas de dançar, cantar, agradar e silenciar. Mas a equação não fecha porque dentro de mim mora um monstro doido para explodir. Este monstro deseja executar um balé alucinante, misto de dança, som e voz, para elevar a máxima potencia minha capacidade de fruir e também de impressionar a todos. 
Com o tempo a ausência de fruição, o tamponamento executado pelo outro (quem quer um monstro deste como colega de trabalho? Quem suporta esta esquizofrenia?) foi me tornando um ser ressentido com a vida. Fui ficando  cada vez mais reclamona, reativa e até aquilo que ainda podia ser alguma arte (dar boas aulas, escrever com qualidade) foi ficando esmaecido. 
Tenho dançado de madrugada, passos de Chapeleiro Maluco, mas sei que perdi o bonde do Bolshoi, do Municipal, do Grupo Corpo. E eu não queria ser menos que isso.
Porém preciso achar uma válvula para o ressentimento. Algo difícil de fazer. Leio dia e noite, escrevo dia e noite, medito sobre isso dia e noite mas o ressentimento permanece como um espinho na carne. E eu não escrevo isso à toa não. Aqui todo mundo parece estar exercendo sua máxima potência. Isso me confunde.  Não fosse prosa talvez este fosse meu "Poema em linha reta", uma maneira de dizer que estou consternada por ter ficado de fora daqueles dois por cento que exerce sua potência máxima (esta cifra é do Clóvis de Barros, não concorda reclama com ele.)
Também é uma forma de te contar que, se você se sente no máximo, vibre mesmo, pois é algo muito difícil de alcançar. 

NSL
03/09/14
03:43

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