domingo, 27 de dezembro de 2015

noturno

apresse-se em descobrir
não há odisseu
átomos hexaedros
tudo que temos 
é desejos, prazer e dor

oh, príncipe taciturno
sou a mulher do norte
a beleza é um atributo difícil
mas nada me impediria
de querer-te

seja breve em ver-me
corra comigo pelas ruas
ignore o rosto da cidade
grotescamente maquiado
pelas luzes de natal

sentados sobre o concreto 
dos bancos de praça
envoltos por nossa névoa sensual
estaremos completamente alheios 
ao toque frio sob as nádegas
ou mesmo ao mundo 
e seu hálito do mal

há olhos escuros 
em meu encalço
famintos me devoram
no afã de esvaziar o desejo

ignoram que o desejo
é como as ervas daninhas
que nunca desistem de renascer
depois de arrancadas

decerto não estou falando de amor
mas, pode um abraço fundir almas?
ouça-me bem, príncipe 
se não vier
deixará um campo devastado
dentro de mim

domingo, 13 de dezembro de 2015

"Não podia imaginar quão feia são as pessoas" foi a primeira coisa que minha amiga disse, na segurança de casa, quando perguntaram se estava feliz com a cirurgia nos olhos. Talvez preferisse a beleza que via detrás de seus dezesseis graus de miopia. Será?
Sempre achei que não ser capaz de ver a distância afetava minha percepção cognitiva do mundo e minha relação com ele. A distância me entristece, assusta, me imobiliza. Procuro me manter sempre perto do meu universo particular e isso me impede de expandir.
Ser estrábica, caolha, como diziam os colegas de escola, eu sei que afeta. O ângulo de visão que ultrapassa os cento e oitenta graus às vezes me leva a ver, nas faces do entorno, a verdade que frontalmente elas não revelam. A visão dupla também é um ponto forte. Me ajuda a deslocar coisas e as pessoas, ver diferente e principalmente me colocar no lugar do outro.
Foi o Antonio Cícero que disse que, se os olhos são a janela da alma, como janela precisam de outros olhos, e outra janela e outros olhos... Por causa desse quadro infinito de olhos e janelas a alma seria tão insondável. Afora a parte insondável, componho minha capacidade de existir nesse mundo, com pouca visão à distância, com muita visão periférica e talvez, como minha amiga,  desejando ver menos. Ver demais pode ser uma experiência bem feia. 

NSL
113/12/15

sábado, 5 de dezembro de 2015

é menos?

é menos
que dentro da mão que dá
haja uma média porção de vaidade?

é menos
que entre braços que lutam
haja braços que incendeiam?

os dias são infernais com lama, fumaça, porrada e fogo

mas é menos
que se minta sobre contas do tesouro
ou se roube para contas no exterior?

é menos 
embriagar-se de uísque
ou ser sedados com rivotril?
 
tivéssemos um vesúvio ativo resolviam-se sem conflitos éticos
contudo nem terremotos aproximam-se da guerra silenciosa 
que escorre vermelha de peles femininas, negras e pobres
a natureza selvagem anda tímida diante de nós

NSL
05/12/15